É difícil manter-se a par do fluxo crescente de notícias e dados sobre as fake news, a desinformação, a informação parcial e a literacia mediática. Este resumo semanal apresenta os destaques das histórias que pode ter perdido.
Os bibliotecários de Harvard provavelmente não adivinhavam as reacções que iam receber quando publicaram um inocente guia online sobre Notícias falsas, desinformação e propaganda. O guia, que inclui algumas dicas úteis/básicas como “usar bases de dados de bibliotecas é uma maneira praticamente infalível de encontrar informação credível”, também contém ligações à lista extensa e muito debatida de Fontes de “notícias” falsas, enganadoras, click-bait e satíricas, da autoria de Melissa Zimdars, professora na Merrimack College. Esta lista inclui actualmente 921 sites catalogados de acordo com várias categorias que incluem “falso”, “sátira”, “conspiração”, “pouco fiável” e “partidário”. Páginas como o Fusion, o National Review e o The Onion são apresentadas ao lado de sites de fake news autênticos, como o denverguardian.com e o site de David Duke. (Também consta da lista o IJR, o único site que conseguiu colocar um repórter no avião do secretário de Estado Rex Tillerson durante a visita deste à Ásia, e que esteve envolvido numa confusão que envolvia a retirada de um artigo.)
Isto é confuso, no mínimo, e o facto de Harvard ter incluído esta lista no seu guia gerou muitas críticas, bem como acusações de que todo o artigo tinha sido escrito por Zimdars, o que não é verdade. (A sua lista também não é “um estudo de Harvard”. E, para que conste, o Nieman Lab faz parte de Harvard, mas também não tivemos nada a ver com ela.) “Em vez de visar histórias que são completamente falsas… a esquerda aplica o rótulo de fake news a plataformas que apresentam histórias factuais mas que retiram daí conclusões políticas – por outras palavras, chamam fake news a tudo aquilo com que não concordam”, escreveu Ben Shapiro, do The Daily Wire, no National Review. (Diz a esquerda: não somos os únicos culpados disto.) T. Becket Adams, do Washington Examiner, entrevistou Zimdars e sugere: “Um dos problemas da base de dados dela é que agrupa histórias 100% falsas, que sabemos serem fabricadas a partir do nada, com cobertura noticiosa que ela considera ser ou demasiado política ou demasiado propensa a click-bait, ou geralmente pouco fiável. No entanto, há uma diferença óbvia entre aquilo que o Daily Caller faz e aquilo que um grupo de adolescentes “fake news” faz na Macedónia. Talvez fosse útil criar listas separadas.”
Quando Harvard publicou o seu guia de investigação pela primeira vez, descreveu a lista de Zimdars como uma “lista enorme de páginas de fake news”. Isto foi alterado para “uma lista informal compilada por alunos para uma cadeira leccionada por Melissa Zimdars na Merrimack College”.
O site Russia Today, afiliado do Kremlin, também lançou um site de detecção de fake news chamado FakeCheck. “Parece difícil lembrarmo-nos disso agora, mas o conceito de fake news era geralmente apartidário apenas há cinco meses, quando se referia principalmente a notícias fabricadas a nível internacional por plataformas falsas que se faziam passar por organizações noticiosas verdadeiras…”, escreveu Will Oremus na Slate. “Actualmente, parece que o termo fake news pode significar ‘notícias que vão contra os interesses das organizações de propaganda russa’.”
Whoopi Goldberg diz que vai processar James McDaniel, o responsável pelo site de fake news “satíricas” The Underground Report, sobre o qual escrevi na semana passada. (O site “noticiou” que Goldberg tinha criticado Carryn Owens, a viúva do Navy SEAL que morreu no raid no Iémen, em Janeiro.) “Se vai envolver alguém em notícias falsas, devia ter autorização dessa pessoa. Não lhe devia ser permitido publicar, porque claramente não se importa com o que podia ter acontecido comigo ou com a minha família,” disse Goldberg no programa The View, esta segunda-feira. O The Underground Report foi encerrado; McDaniel alegou (numa publicação agora guardada em cache) que apesar de ser “verdade que quando comecei o site estava sobretudo a brincar e não esperava atrair muita atenção com o meu trabalho, na altura em que escrevi a história sobre Goldberg, o projecto tinha-se transformado numa experiência plena com consequências sociais e políticas significativas, envolvendo a divulgação e crença em histórias bizarras de notícias falsas e a maneira como elas se relacionam com o confirmation bias [tendência para confirmar convicções] e a dissonância cognitiva nos indivíduos que as promovem.” A responsabilidade, argumentou McDaniel, pertence aos leitores: “Porque é que Whoopi só me mencionou a mim e não atribuiu praticamente nenhuma responsabilidade às pessoas que leram e partilharam os artigos, muitas vezes acompanhados com comentários de um ódio intenso?” (Numa notícia algo relacionada, esta semana Mark Zuckerberg afirmou: “Ninguém na nossa comunidade quer informação falsa. Toda a gente quer informação verdadeira.”)
“[O Facebook e o Google] têm muito mais poder para lidar com isto do que enviar pessoas a conferências para anunciar que estão ‘a tratar do assunto’”, diz Jonny Hornby, da empresa de marketing The&Partnership, sobre o papel dos gigantes tecnológicos no combate à fraude publicitária.
“Espalhamos histórias porque sabemos que provavelmente vão ser uma espécie de prova-dos-nove. A forma como as pessoas reagem indica se estão preparadas para ficar do nosso lado.” Na Atlantic, Julie Beck analisa por que razão é tão difícil fazer com que as pessoas mudem de ideias. Afirma o antropólogo e psicólogo Pascal Boyer: “Se encontrarmos dez pessoas que aparentam ter mais ou menos a mesma ideia, isso engana o nosso sistema de modo a pensarmos que deve ser uma ideia provável, porque muita gente concorda com ela. O que assumimos, inconscientemente, é que estas dez pessoas chegaram à mesma crença de maneira independente. Não pensamos que nove delas estão apenas a repetir uma coisa que a décima pessoa disse.”
The Portuguese version of this story was published with Publico.