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March 29, 2017, 9:59 a.m.
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LINK: www.pewinternet.org  ➚   |   Posted by: Joseph Lichterman   |   March 29, 2017

A qualidade do discurso público na Internet não vai melhorar e até pode piorar na próxima década, de acordo com um inquérito publicado pelo Pew Research Center, que convidou a oito mil peritos em tecnologia, académicos, empresários e responsáveis políticos a responder.

Dos 1537 participantes, 42% disseram que não antecipavam “nenhuma mudança significativa” nos níveis de trolling online e outros comportamentos nocivos que se encontram na Internet. Outros 39% disseram que a próxima década será “mais marcada” por este tipo de comportamentos online.

“Os inquiridos expressaram várias opiniões, incluindo preocupação profunda, desilusão, resignação e optimismo, mas a maioria concordou que as pessoas – no seu melhor e no seu pior – ganham poder com as tecnologias de comunicação em rede”, escreveram os autores do estudo. “Alguns dos participantes disseram que as discussões hostis e a manipulação estratégica do zeitgeist podem estar apenas no início, a não ser que se criem soluções tecnológicas e humanas para reforçar a comunicação civilizada.”

O Pew e o Imagining the Internet Centre da Universidade Elon realizaram este estudo entre 1 de Julho e 12 de Agosto de 2016, antes do auge do sectariamos das eleições norte-americanas.

O relatório divide as respostas em quatro temas principais, que definem como poderá ser o futuro da comunicação na Internet:

“As coisas vão continuar más porque agir como um troll é humano; o anonimato incentiva comportamentos anti-sociais; as injustiças motivam pelo menos uma parte do discurso inflamatório; e a escala e complexidade crescentes da comunicação na Internet tornam difícil derrotar isto.”

Muitos dos inquiridos acreditam que a situação só vai piorar, à medida que os humanos continuem a evoluir num meio relativamente novo.

“Gostaria muito de acreditar que o discurso vai melhorar ao longo da próxima década, mas temo que as forças que o tornam pior ainda não se esgotaram completamente”, disse o consultor de tecnologia Jerry Michalski. “Afinal, demorámos quase 70 anos a tornar obrigatório o uso dos cintos de segurança. E não temos a mesma sensatez sobre como manter conversas fiáveis na Internet, muito menos como debater assuntos difíceis. No longo arco da história que se inclina na direcção da justiça, tendo em conta os tempos acelerados em que vivemos, acredito que vamos resolver este problema. Mas não no espaço de uma década.”

“Vemos uma corrente negra de pessoas para quem liberdade de expressão é o mesmo que dizer seja o que for, inclusivamente discursos de ódio ou que não estão de acordo com conclusões científicas respeitadas”, disse um professor anónimo do MIT. “Estes encontram na tecnologia não-mediada um lugar onde as suas opiniões podem ter um efeito multiplicador e onde são eles que se tornam as elites.”

As coisas vão continuar mal porque os incentivos económicos e políticos tangíveis e intangíveis apoiam o trolling. Participação = poder e lucros.

O ecossistema das redes sociais baseia-se na atenção; as plataformas ganham dinheiro com a publicidade e, consequentemente, querem continuar a incentivar a participação. E, como as plataformas estão tão lotadas, costumam ser as vozes mais estridentes que recebem mais atenção – o que se estende aos nossos debates políticos mais importantes.”

“A desconfiança e o trolling estão a acontecer ao mais alto nível no debate político”, disse a investigadora Kate Crawford. “A janela de Overton foi consideravelmente expandida pelas eleições presidenciais americanas de 2016, e não de uma maneira positiva. Ouvimos candidatos presidenciais a dizer que iam proibir os muçulmanos de entrar no país, a pedir a potências estrangeiras que pirateassem antigos funcionários da Casa Branca, a retweetar neonazis. O trolling é uma forma de discurso político que está generalizada.”

À medida que aumentou a influência das redes sociais, os meios de comunicação tradicionais viram a sua influência diminuir. Steven Waldman, fundador e CEO do LifePosts, explicou isto do seguinte modo: “Com certeza que parece nobre dizer que a Internet democratizou a opinião pública. Mas já se tornou claro: ela deu voz a quem não tinha voz por ser uma minoria oprimida e também a quem não tinha voz por ser excêntrico… No final, podem não ser necessariamente os ‘maus’ (isto é, os racistas, misóginos, etc.) a vencer, mas temo que eles vão ser os mais estridentes.”

As coisas vão melhorar porque, à medida que o mundo online se divide em zonas sociais segmentadas e controladas, vão surgir soluções técnicas e humanas com a ajuda da inteligência artificial.

Alguns dos inquiridos estavam mais optimistas de que o nível do discurso na Internet iria melhorar ao longo da próxima década. Segundo estes, a inteligência artificial e outros desenvolvimentos tecnológicos vão ajudar a melhorar o diálogo.

“Antevejo o desenvolvimento de mais bots sociais e filtros algorítmicos que vão erradicar uma parte dos trolls e do discurso de ódio”, disse Marina Gorbis, directora executiva do Institute for the Future. “Antevejo a criação de bots para promover ligações benéficas e, potencialmente, inserir dados/ factos/ histórias específicas a cada contexto, o que iria favorecer um discurso mais positivo. É claro que todos os filtros e algoritmos vão criar problemas em relação àquilo que está a ser filtrado e sobre que valores estão incorporados nos algoritmos.”

Além disso, à medida que as plataformas são cada vez mais influenciadas por algoritmos, os inquiridos esperam ver uma fragmentação contínua do ecossistema online.

“Haverá alguns lugares onde podemos encontrar pessoas com quem discutir, mas estes vão estar mais limitados a uns poucos locais do que estão actualmente”, disse a investigadora sénior de design Lindsay Kenzig.

“A fiscalização e a moderação de comunidades têm custos. Algumas soluções podem alterar ainda mais a natureza da Internet devido ao aumento da vigilância; o Estado pode regular debates; e estas mudanças vão dividir as pessoas e limitar o acesso à informação e a liberdade de expressão.”

Os inquiridos também expressaram a preocupação com a possibilidade de o aumento da regulação de espaços online poder levar à vigilância e à censura. Também temem que as pessoas possam começar a mudar os seus comportamentos positivos na Internet com o aumento da vigilância.

Rebecca MacKinnon, directora do projecto Ranking Digital Rights na fundação New America, disse estar preocupada com o estado da liberdade de expressão online:

Os pedidos para que o Estado e as empresas censurem e vigiem os utilizadores da Internet chegam de um conjunto de agentes cada vez mais diverso, com várias preocupações legítimas sobre segurança, bem como preocupações sobre o discurso civil, estão a ficar de tal forma inquinados que se torna impossível haver uma gestão racional e baseada em factos reais. Estou cada vez mais convencida de que as soluções, se de facto surgirem, serão humanas/ sociais/ políticas/ culturais e não técnicas.

Marcus Foth, professor da Universidade de Tecnologia de Queensland, avisou que o aumento da regulação do discurso online poderá resultar em divisões e “bolhas de filtro”:

Com menos anonimato e menos diversidade, os dois grandes problemas da era 1.0 da Web foram resolvidos numa perspectiva comercial: há menos trolls que se escondem atrás do anonimato. Mas o que é que se perde com este processo? A cultura dos algoritmos cria “bolhas de filtro”, que criam o risco da polarização da opinião em “câmaras de eco”.

O relatório completo, onde poderá encontrar pelo menos uma opinião com a qual concorda, está disponível aqui.

The Portuguese version of this story was published with Público. Translation by Rita Monteiro.

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